segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Wake up call...

Não sou apologista de grandes mensagens com apelos morais para as grandes questões da humanidade, nem nada que se pareça. Não pretendo fazer de um blog uma reflexão sobre as injustiças mundiais e humanitárias, muito menos dar lições a quem quer que seja. Mas, sinceramente, há coisas que me chocam e que me deixam completamente perplexa. A situação que se vive na República Democrática do Congo é uma delas. Há uns dias, durante uma revista de imprensa, a minha entrevistada perguntou "Mas como é que eu nunca ouvi falar disto e, de repente, quando leio os jornais, já se fala em 1 milhão de desalojados??". E ela tem toda a razão.

Os conflitos entre os rebeldes e as forças pró-governo já provocaram, só em Kivu Norte, cerca de 250 mil deslocados. Só nessa região! A Organização Mundial de Saúde já alertou para a ameaça de cólera que atinge, nada mais nada menos, do que 2,5 MILHÕES DE PESSOAS. Todos os dias, morrem dezenas de pessoas com a doença. E o que eu não percebo é o que raio anda a comunidade internacional a fazer!

Claro que, sempre que falamos de África, há milhares de dados que nos podiam levar a reflexões intermináveis. Mas, não tenho dúvidas, a situação no Congo não é semelhante a outra coisa. E numa altura em que tanto ouvimos falar de soluções globais, concertação de medidas e esforços, nomeadamente para enfrentar uma crise financeira, quando toca ao Congo o lema é "deixem-nos lá resolver os problemas deles".
Hoje ouvi o nosso ministro dos Negócios Estrangeiros dizer que está fora de questão o envio de forças europeias para a região. Porquê? Porque seria "precipitado". É melhor deixar os senhores rebeldes e o governo entenderem-se. Não é que eu defenda que Portugal devia enviar para lá os nossos “geninhos”, mas a pergunta que me apetece fazer ao excelentíssimo Luís Amado é “Ah é precipitado? E não era precipitado quando se tratou de enviar os nossos tugas para o Iraque??”. Pois claro, centenas de pessoas a morrer todos os dias não é comparável à ameaça que o governo de Saddam Hussein representava. Por amor de Deus!

E, enquanto jornalista, deixa-me triste que, para cobrir as eleições nos EUA, se mobilizem centenas e centenas de profissionais da imprensa, televisão e rádio e, perante uma atrocidade destas que se vive no Congo, contam-se pelos dedos das mãos os jornalistas que lá estão. Deixa-me triste que, nos alinhamentos de jornais do prime-time, estejam peças de 3 minutos sobre o novo disco do José Castelo Branco e, sobre o Congo, um textinho de 20 segundos no meio de uma “síntese” do dia. “As pessoas não se interessam por isso”, dizem. E o mais provável é que tenham razão. Mas, desculpem lá, eu não consigo passar ao lado disto e fingir que o Congo fica noutro planeta que não nos interessa.


Kivu Norte, Congo, 2008

3 comentários:

Anónimo disse...

Botou faladura! é isso aí! Os alinhamentos são os alinhamentos...matanças e deslocados em África é mato...

Cristina disse...

Não posso concordar mais. E contra mim falo: é demasiado fácil deixar passar ao lado o que não nos provoca choque.

Tivesse o Congo mais interesses (no sentido económico da palavra) e a História seria outra.

MiSs Detective disse...

é um belo começo na blogoesfera!